Primeiras leituras


E-mail this post



Remember me (?)



All personal information that you provide here will be governed by the Privacy Policy of Blogger.com. More...





“ A intimidade perdida...
Neste princípio de insónia, repenso o ritual da leitura, todas as noites, à cabeceira da cama, quando ele era pequeno, a horas fixas e com gestos imutáveis: era de certo modo como uma oração. O súbito armistício depois da balbúrdia do dia, os reencontros livres de todas as contingências, o momento de silêncio concentrado antes das primeiras palavras da história, a nossa voz que finalmente soa como de facto é, a liturgia dos episódios... Sim, a história lida todas as noites constituía a mais bela função da oralidade, a mais desinteressada, menos especulativa, a que dizia respeito apenas aos homens: o perdão das ofensas. Não se confessava nenhuma falta, não havia qualquer preocupação em receber uma porção de eternidade, era um momento de comunhão entre nós, a absolvição do texto, um regresso ao único paraíso que tem valor: a intimidade. Sem que o soubéssemos, descobríamos uma das funções essenciais do conto, e mais generalizadamente da arte em geral, que é impor uma trégua no combate entre os homens.
O amor ganhava um novo rosto.
E era gratuito.”
Daniel Pennac, Como um Romance, Lisboa, Edições Asa, 2002.

Pintura: Brenda Joysmith, Bedtime Story, 1991.


0 Responses to “Primeiras leituras”

Leave a Reply

      Convert to boldConvert to italicConvert to link

 


About me

Previous posts

Archives

Bocas de Incêndio

Boqueirões


ATOM 0.3